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Por Cássio Cavalli.
Professor da FGV Direito SP. Advogado, parecerista e árbitro.
As interações entre a disciplina da execução fiscal e o processo recuperacional seguem suscitando relevantes indagações mesmo após a reforma da Lei 11.101/2005 levada a cabo pela Lei 14.112/2020. A questão assenta sobre a tensão que há entre a possibilidade de continuação das execuções fiscais contra empresa em recuperação judicial, de um lado, e o risco que a continuação das execuções fiscais acarreta para a preservação da empresa, de outro. Em síntese, a questão submetida ao Judiciário é: como conciliar a norma contida no art. 187 do CTN, que isenta o crédito tributário de participar da recuperação judicial, ao mesmo tempo em que se promove a preservação da empresa pelo processo recuperacional? Variações desta indagação foram inúmeras vezes devolvidas ao STJ, que, de modo expedito e consistente, constituiu um seguro e sólido corpo jurisprudencial a orientar a atuação das Cortes brasileiras. Seguindo a trilha aberta pelos Tribunais, o legislador detalhou a questão no § 7º-B do art. 6º da Lei 11.101/2005, ao dispor que a execução fiscal não se suspende pelo deferimento da recuperação judicial, mas sua continuação não pode recair sobre “bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial”. Deste modo, buscou contemplar a um só tempo a tutela executiva do crédito tributário e o objetivo normativo de preservar empresas em recuperação judicial. Mantendo a presteza e a consistência na prestação jurisdicional, logo após a promulgação da Lei 14.112/2020, a Segunda Seção do STJ, por unanimidade, em aresto da segura relatoria do Min. Marco Aurélio Belizze,[1] firmou os claros critérios orientadores da interpretação do § 7º-B do art. 6º da Lei 11.101/2005 relativos à caracterização de conflito de competência entre o juízo recuperacional e o juízo da execução fiscal.
Com efeito, o deferimento do processamento da recuperação judicial não suspende, per se, a execução fiscal. Porém, caso a execução fiscal coloque em risco a preservação da empresa, poderá haver a suspensão da prática de atos na execução fiscal. Esta norma nada mais é do que concretização do conteúdo normativo compartilhado pelos princípios mais gerais da preservação da empresa (art. 47 da LRF) e da menor onerosidade da execução (art. 805 do CPC, aplicável à execução fiscal pelo art. 1º da Lei 6.830/1980).[2] A execução fiscal não pode recair de modo mais oneroso sobre o patrimônio da empresa e colocar em risco a sua preservação. Se isto ocorrer e a empresa estiver em recuperação judicial, competirá ao juízo recuperacional decidir sobre a alocação de bens da empresa recuperanda (conforme a Súmula 480 do STJ). Daí, aliás, decorre a possibilidade de haver conflito de competência entre o juízo recuperacional e o juízo da execução fiscal. Conquanto esta seja a hipótese de suspensão de execuções fiscais contra empresa em recuperação judicial que foi sucessivamente devolvida à apreciação de nossas Cortes, existem, no ordenamento jurídico brasileiro, outros fundamentos para a suspensão das execuções fiscais que não decorrem do princípio da preservação da empresa. São hipóteses fundadas em critérios distributivos, que versam sobre preferências creditórias. Estas normas orientam a prestação jurisdicional da execução fiscal em uma série de situações já cristalizadas pela jurisprudência, mas ainda estão por ser devolvidas aos nossos tribunais em matéria de recuperação judicial.
A primeira hipótese normativa encontra-se positivada no art. 186, caput, do CTN, que atribui ao crédito trabalhista preferência creditória sobre qualquer outro crédito, inclusive o crédito tributário. A preferência do crédito trabalhista é norma de direito material com conteúdo publicístico, consoante a expressão de Pontes de Miranda.[3] A preferência situa-se na pretensão de direito material e orienta a prestação jurisdicional executiva do Estado. Nesse sentido são os julgados de nossa Corte Superior, conforme se pode ver em recentes arestos relatados pelo Min. Og Fernandes[4] e pelo Min. Francisco Falcão.[5] O reconhecimento da preferência pressupõe que mais de um credor pretenda fazer recair a pretensão executiva sobre o patrimônio ou mesmo elemento do patrimônio do mesmo devedor,[6] de modo que se tenha que reconhecer a preferência da pretensão de um credor e a correspondente subordinação da pretensão de outro credor. Neste sentido, o crédito trabalhista prefere a qualquer outro, inclusive o crédito tributário, o crédito de obrigação propter rem e o direito de credor não trabalhista de adjudicar bem penhorado.[7] Ademais, a preferência do crédito trabalhista é assegurada mesmo que o credor trabalhista ainda não tenha ajuizado processo de execução, conforme criteriosos acórdãos de relatoria do Min. Marco Buzzi,[8] do Min. Luis Felipe Salomão[9] e da Min. Nancy Andrighi.[10] Em razão de a preferência decorrer de norma de direito material, o credor trabalhista pode sobrestar a execução fiscal, de modo a assegurar que o crédito tributário não seja satisfeito antes do crédito trabalhista. Por isso a preferência pode ser invocada independentemente de haver execução trabalhista, pois basta o crédito, embora a preferência também seja tutelada caso já tenha sido aparelhada a execução trabalhista. Nesta última hipótese, compete ao juízo trabalhista a execução preferencial do crédito trabalhista. Pelo mesmíssimo fundamento, a preferência igualmente se mantém mesmo em caso de eventual suspensão da execução trabalhista. Aqui, cabe um esclarecimento. A preferência manifesta-se independentemente de o devedor ser solvente ou insolvente. Assim, a preferência se manifesta em concurso especial de credores que penhoram um mesmo bem de devedor solvente (art. 908, § 2º, do CPC c/c art. 186 do CTN). Porém, a preferência tem ainda maior razão de ser em caso de insolvência do devedor, pois, neste caso, violar a ordem de preferência coloca em risco a efetiva satisfação do crédito preferencial. Por isso, em caso de o devedor comum estar em recuperação judicial, não pode o Estado permitir que a execução fiscal prossiga de modo a violar a preferência do crédito trabalhista, mormente pelo fato de que a recuperação judicial suspende a execução trabalhista. Neste caso, a competência para a tutela da satisfação do crédito trabalhista é deslocada para o juízo recuperacional, consoante já decidiu o Tribunal Pleno do STF em recurso com repercussão geral.[11] Com efeito, compete ao juízo recuperacional assegurar a observância da preferência do crédito trabalhista, competência, esta, que se sobrepõe inclusive à do juízo da execução fiscal.
De igual modo, não são permitidos outros expedientes que contornem a preferência do crédito trabalhista e satisfaçam preferencialmente o crédito tributário. Por isso mesmo, o parcelamento e a transação fiscais não podem levar à inversão das preferências asseguradas ao crédito trabalhista. Por evidente que nada obsta a que sejam pactuados parcelamentos e transações tributárias; porém, o pagamento do crédito fiscal parcelado não pode ser iniciado antes de ser pago o crédito trabalhista, sob pena de inversão da preferência assegurada pelo art. 186, caput, do CTN. Ademais, a norma do parágrafo único do art. 186 do CTN apenas reforça a norma geral do caput, pois prevê subordinação ainda maior ao crédito tributário em caso de falência. Bem concretamente, o ordenamento jurídico brasileiro não contempla hipótese em que o crédito tributário possa buscar e efetivamente obter preferência de pagamento em relação ao crédito trabalhista. A única hipótese decorre da vontade do credor trabalhista, titular de direito patrimonial disponível. Assim, pode o credor trabalhista optar por não invocar sua preferência em autos de execução fiscal, assim como pode a classe de credores trabalhistas concordar com alteração da preferência prevista em plano de recuperação judicial. Se a classe trabalhista não concordar e rejeitar o plano de recuperação judicial, haverá falência, hipótese em que o crédito tributário se sujeitará a uma subordinação ainda maior, nos termos do art. 186, parágrafo único, do CTN, que corresponde a uma preferência ainda maior do crédito trabalhista, tanto na porção de até 150 salários-mínimos (inciso I do art. 83 da Lei 11.101/2005), quanto no que sobejar e for classificado como quirografário (inciso VI do art. 83 da Lei 11.101/2005), que tem preferência sobre as multas fiscais e administrativas (inciso VII do art. 83 da Lei 11.101/2005).
A lição que fica é que normas procedimentais não podem violar a preferência material do crédito trabalhista. As implicações disso são enormes: se o plano de recuperação judicial for aprovado inclusive pela classe dos credores trabalhistas, não se poderá subordinar a efetiva homologação do plano à previa apresentação de certidões de regularidade fiscal da empresa em recuperação. Do contrário, se estará a subordinar a vontade dos credores trabalhistas a ato de credor fiscal, isto é, a vontade de credores preferenciais será subordinada a credores de hierarquia inferior, cujo veto ao plano de recuperação tem por consequência retardar o começo do pagamento do crédito trabalhista preferencial. (Ademais, a exigência de certidão de regularidade fiscal para homologação, atavismo remanescente da legislação tributária da primeira metade do século XX, viola frontalmente o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, pois subordina a prestação jurisdicional recuperacional a um ato administrativo!)
Há um outro argumento distributivo igualmente relevante, que conduz à suspensão das execuções fiscais contra a empresa em recuperação judicial: o pacto federativo consagrado no art. 19, III, da Constituição. Este, aliás, é um relevantíssimo dado normativo a orientar a interpretação das relações entre o sistema recuperacional e o sistema de cobrança do crédito tributário. A disciplina de parcelamento e de transação fiscal positivada pela Lei 14.112/2020 alcança apenas o passivo tributário com a União. O parcelamento e a transação fiscal do passivo decorrente de tributos de competência das 27 unidades federativas e dos mais de 5500 Municípios dependem de lei promulgada na esfera de competência dos respectivos entes federados. Com efeito, pode ocorrer de um ente federado não ter disciplinado o parcelamento fiscal ou de não ter ainda concedido parcelamento ao tempo da concessão de parcelamento pela União. Esta preferência é agravada por envolver empresa em recuperação judicial, cujo patrimônio pode não comportar o pagamento integral de todos os credores. Em ambas as hipóteses, o parcelamento com a União pode conduzir a uma preferência da satisfação do crédito tributário da União em detrimento dos créditos tributários detidos por Estados e Municípios. A estes restaria continuar a perseguir a satisfação de seus créditos por meio de execuções fiscais. Porém, em junho de 2021, ao julgar a ADPF 357 pela segura relatoria da Min. Cármen Lúcia,[12] o STF reconheceu a igual hierarquia dos créditos da União, Estados e Municípios, e declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 187 do CTN. Por conseguinte, foi cancelado o verbete da Súm. 563 do STF e indiretamente foi afetada a Súm. 497 do STJ. Este precedente acarreta profundas implicações para o sistema de execução fiscal e também para o sistema recuperacional. Em primeiro lugar, por figurarem em um mesmo nível de preferência, os créditos da União, Estados e Municípios devem ser pagos pro rata, não se admitindo que a União tenha preferência para obter satisfação do seu crédito. No sistema de execuções fiscais, isso significa que Estados e Municípios podem penhorar, no rosto dos autos de execução fiscal federal, para obter a sua parcela proporcional de pagamento. Se a execução fiscal federal estiver suspensa por parcelamento ou transação, idem: os Estados e Municípios podem postular a distribuição pro rata sobre o valor das parcelas devidas à Fazenda Nacional. Do contrário, estar-se-ia a permitir que o parcelamento tributário contornasse o sistema de preferências que impera na execução fiscal por ele suspensa, em flagrante violação do pacto federativo. Com efeito, o inverso também não é permitido pelo mesmo fundamento; isto é, a execução fiscal estadual ou municipal não pode prosseguir de modo a assegurar pagamento preferencial em detrimento da satisfação de crédito da União, cuja exigibilidade está suspensa pelo parcelamento ou transação concedidos. De igual modo, a não concessão de parcelamento ou transação por um ente federado não pode ser causa de não concessão da recuperação judicial, pois nesta hipótese o crédito dos demais entes federados terá seu pagamento subordinado na falência, ainda que estes tenham concedido parcelamento fiscal.
Ao fim e ao cabo, parece evidente que o sistema de supremacia do executivo fiscal[13] instituído pelo art. 187 do CTN não condiz com a ordem constitucional brasileira, pois conduz a graves violações ao pacto federativo, que podem ser evitadas pela concentração da atividade executiva em um único juízo, isto é, em um juízo concursal, como o juízo recuperacional. Esta, aliás, é a vocação natural do juízo recuperacional que, por pertencer à Justiça Estadual, pode reunir em concurso pretensões de competência originária da Justiça Federal e da Justiça do Trabalho. Há também razões de outras ordens, relacionadas à eficiência da administração pública (art. 37 da CF) e à efetividade da prestação jurisdicional (art. 5º, XXXV, da CF), que levam à mesma conclusão, mas que, por assentarem em imperativos eficientistas, deixarei para explorá-las noutra oportunidade. Neste artigo, quero apenas sublinhar o papel das preferências creditícias quando da interpretação das normas relativas ao tratamento do crédito tributário contra empresa em recuperação judicial. Para tanto, já contamos com formidável jurisprudência do STJ sobre como se deve assegurar a preferência de pagamento de créditos trabalhistas e do STF acerca da relevância do pacto federativo para a tutela jurisdicional executiva do crédito tributário. Afinal, as preferências creditórias devem ser levadas a sério inclusive com relação a suspensão de execuções tributárias manejadas contra empresas em recuperação judicial.
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[1] STJ, CC 181.190, Segunda Seção, j. 30.11.2021, v.u., rel. Min. Marco Aurélio Belizze.
[2] Sobre o compartilhamento de conteúdo normativo entre o princípio da preservação da empresa e o princípio da menor onerosidade da execução, ver CAVALLI, Cássio. O princípio da menor onerosidade e a penhora de faturamento da empresa. Revista dos Tribunais, 101, 926, p. 701-732. 2012.
[3] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. t. XXVII. São Paulo: Revista dos Tribunais 2012, § 3.235, p. 221.
[4] STJ, AgInt no AREsp 1.748.230, Segunda Turma, j. 19.10.2021, v.u., rel. Min. Og Fernandes (“Esta Corte de Justiça possui o entendimento de que não é possível sobrepor uma preferência de direito processual, crédito tributário, a uma de direito material, crédito trabalhista, em conformidade com a previsão do art. 186 do CTN. 2. Essa preferência independe da data em que registrada a penhora. Assim, é possível ao detentor do crédito trabalhista, na fase de arrematação, havendo créditos a serem adimplidos, postular o reconhecimento do seu direito preferencial sobre o crédito obtido na alienação do bem penhorado.”).
[5] STJ, AgInt no REsp 1.746.907, Segunda Turma, j. 24.11.2020, v.u., rel. Min. Francisco Falcão (“Não é possível sobrepor uma preferência de direito processual, crédito tributário, a uma de direito material, crédito trabalhista, em conformidade com a previsão do art. 186 do CTN. IV - A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é pacífica neste sentido, ou seja, de que o crédito da Fazenda Pública leva preferência sobre qualquer outro, exceto os de natureza trabalhista, não se lhe aplicando as regras do artigo 711 do Código de Processo Civil. Precedentes: AgInt no REsp 1328688/PR, Rel. Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), DJe 27/09/2018; REsp n. 1.278.545/MG, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, DJe 16/11/2016 e AgRg no REsp 1491126/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 19/12/2014.”).
[6] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. t. XXVII. São Paulo: Revista dos Tribunais 2012, § 3.235, p. 221.
[7] Assim, ver STJ, REsp 1.539.255, Terceira Turma, j. 27.11.2018, v.u., rel. Min. Nancy Andrighi (“Ação de cobrança de despesas condominiais, já em fase de cumprimento de sentença. 2. Ação ajuizada em 08/08/2012. Recurso especial concluso ao gabinete em 26/08/2016. Julgamento: CPC/73. 3. O propósito recursal é definir se há - sobre o produto da arrematação de bem imóvel - preferência de crédito trabalhista ao crédito condominial. 4. Esta Corte entende não ser possível sobrepor uma preferência de direito processual a uma de direito material, preferindo o credor trabalhista aos demais, sobre o crédito obtido na alienação do bem penhorado.”); e STJ, REsp 1.411.969, Terceira Turma, j. 10.12.2013, v.u., rel. Min. Nancy Andrighi (“o direito do exequente de arrematar o bem com seu crédito está condicionado à inexistência de outros credores com preferência de grau mais elevado”).
[8] STJ, AgInt no REsp 1.764.630, Quarta Turma, j. 30.08.2021, v.u., rel. Min. Marco Buzzi (“O credor com título de preferência legal pode participar do concurso previsto no art. 711 do CPC/73 - correspondente ao art. 908 do NCPC - para resguardar o seu direito de preferência, mesmo que não tenha promovido a execução do seu crédito. Nessa hipótese, reconhecida a preferência do crédito, o levantamento do valor fica condicionado a posterior ajuizamento de execução.”).
[9] STJ, REsp 280.871, Quarta Turma, j. 05.02.2009, v.u., rel. Min. Luis Felipe Salomão (“garante-se o direito de preferência do credor [trabalhista] apenas reservando-lhe o produto da penhora, ou parte deste, levada a efeito em execução [fiscais] de terceiros, condicionando o seu levantamento a execução futura aparelhada pelo próprio credor.”).
[10] STJ, REsp 1.219.219, Terceira Turma, j. 17.11.2011, v.u., rel. Min. Nancy Andrighi (“No concurso singular de credores, o crédito tributário prefere a qualquer outro, ressalvados aqueles decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho. 2. O credor com título de preferência legal pode participar do concurso previsto no art. 711 do CPC para resguardar o seu direito de preferência, mesmo que não tenha promovido a execução do seu crédito. Nessa hipótese, reconhecida a preferência do crédito, o levantamento do valor fica condicionado a posterior ajuizamento de execução.”).
[11] STF, RE 583.955, Tribunal Pleno, j. 28.05.2009, m.v., rel. Min. Ricardo Lewandowski (a Justiça do Trabalho é competente para apurar o crédito trabalhista contra empresa em recuperação, mas o pagamento do crédito compete à Justiça Estadual, onde tramita a recuperação judicial). Ao recurso conferiu-se repercussão geral em 19.06.2008 (“[o]ferece repercussão geral a questão sobre qual o órgão do Poder Judiciário é competente para decidir a respeito da forma de pagamento dos créditos, incluídos os de natureza trabalhista, previstos no quadro geral de credores de empresa sujeita a plano de recuperação judicial”).
[12] STF, ADPF 357, Tribunal Pleno, j. 24.06.2021, m.v., rel. Min. Cármen Lúcia (“A arguição de descumprimento de preceito fundamental viabiliza a análise de constitucionalidade de normas legais pré-constitucionais insuscetíveis de conhecimento em ação direta de inconstitucionalidade. Precedentes. 2. A autonomia dos entes federados e a isonomia que deve prevalecer entre eles, respeitadas as competências estabelecidas pela Constituição, é fundamento da Federação. O federalismo de cooperação e de equilíbrio posto na Constituição da República de 1988 não legitima distinções entre os entes federados por norma infraconstitucional. 3. A definição de hierarquia na cobrança judicial dos créditos da dívida pública da União aos Estados e Distrito Federal e esses aos Municípios descumpre o princípio federativo e contraria o inc. III do art. 19 da Constituição da República de 1988. 4. Cancelamento da Súmula n. 563 deste Supremo Tribunal editada com base na Emenda Constitucional n. 1/69 à Carta de 1967. 5. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada procedente para declarar não recepcionadas pela Constituição da República de 1988 as normas previstas no parágrafo único do art. 187 da Lei n. 5.172/1966 (Código Tributário Nacional) e no parágrafo único do art. 29 da Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais).” No voto da relatora, lê-se: “Não verificando no texto constitucional de 1988 fundamento válido para acolher no ordenamento jurídico brasileiro norma infraconstitucional que crie distinções entre os entes federados na cobrança judicial dos créditos tributários e não tributários, tenho como procedente o pedido apresentado na presente arguição de descumprimento de preceito fundamental.”).
[13] Tomei a expressão emprestada de BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense. 1993, p. 607.